A psicóloga argentina Clara Coria escreve que postergar o prazer com a intenção de responder a uma imagem idealizada do sacrifício é uma forma de “civilizada mutilação”. Seria, segundo a autora, como colocar-se no freezer para uma melhor ocasião, que talvez não chegue a apresentar-se porque algum “corte de luz” poderia arruinar as expectativas planejadas.
Conta a autora que certa vez o marido chegou em casa trazendo camarões gigantes recém-pescados e queria comê-los no jantar, ela porém decidiu colocá-los no freezer para degustá-los em uma ocasião especial, com uma visita… Dias depois, enquanto estavam fora num final de semana, houve um corte de energia estragando todo aquele que seria “o manjar dos deuses”.
O importante é que tenhamos uma visão realista: toda vez que retardamos uma ação que nos convém a consequência é uma perda pessoal, pois aquilo que poderíamos fazer e não o fazemos amanhã não se sabe se poderá ser feito, temos um dia a mais de descaminho.
Tudo bem, enfrentamos a situação e fazemos outras coisas, porque a vida é dinâmica e não é jamais obstruída, com ou sem o sujeito. Se estamos despertos, somos vida, mas se dormimos a vida são outros e nós não existimos.
Lembra-nos o escritor inglês Aldous Huxley: “Vivemos, agimos e reagimos uns com os outros, mas sempre e em quaisquer circunstâncias existimos a sós”.
Não raras vezes acolhemos dinâmicas não coincidentes com o nosso projeto, permitindo ingerências externas. Aceitamos transferências, desvios e por isso perdemos a meta da nossa pulsão. Isso significa permitir que sejam inseridas contracargas que impedem a consecução do fim que almejamos, um descontínuo na nossa unidade de ação.
Se você não é exatamente tão perfeita quanto gostaria, vamos fazer o melhor possível: fidelidade a si mesmo significa coerência ao projeto pessoal, continuamente sustentado e promovido por atividade síncrona, específica. Tomar conta de si mesmo significa agir de modo permanente, ordenado, regular e coordenado ao movimento vital do próprio projeto existencial no ambiente em que vivemos.
E depois, conforme cita a empresária e consultora de moda Costanza Pascolato, poder viver situações de merecido orgulho profissional ao dizer: “Poxa, que legal, tem alguém que me reconhece e sabe o que eu faço!”
Por Alice Schuch, palestrante e pesquisadora do universo feminino